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A outra visita a São Paulo numa HQ do Batman

O ano é 2021 e todos celebram a publicação de Batman – O Mundo, uma antologia onde o Morcegão visita uma série de países, em histórias sempre desenvolvidas por criadores das respectivas nações. A que mais nos chama atenção, claro, é a história brasileira, com roteiro de Carlos Estefan, arte de Pedro Mauro e cores de Fabi Marques (e Marcelo Maiolo, na capa).

Batman vigia o centro de São Paulo no topo do edifício Martinelli, com o Farol Santander ao fundo.

Não é a primeira vez que Batman visita nosso país, inclusive em 1993 a Editora Abril chegou a publicar, em um especial chamado Batman no Brasil, uma trama escrita por Peter Milligan onde o herói visitava o Rio de Janeiro para enfrentar o vilão Idiota. A HQ era cheia de esteriótipos, mas até que lidava com alguns problemas sociais reais, como jovens abandonados e o tráfico de drogas na cidade. De forma tosca, mas tocava no assunto – nada no nível da história escrita por Carlos Estefan, que traz um panorama fiel da realidade social da cidade de São Paulo.

E é de São Paulo que quero falar nesta Batzarro. Ao contrário do que muitos pensam, essa não foi a primeira vez que São Paulo foi o cenário central de uma HQ do Batman, e a vez anterior é bizarra demais para passar em branco…

A minissérie The Batman Adventures: The Lost Years, com roteiro de Hilary Bader e arte de Bo Hampton, se propunha a completar a lacuna entre as animações Batman: The Animated Series e The New Batman Adventures, quando Dick Grayson se torna o Asa Noturna e Tim Drake assume o manto de Robin.

O que importa para nós é a terceira edição, onde Dick Grayson aparece em São Paolo (sic), elogiando o clima e… treinando capoeira com um grupo de indígenas?

É tanta coisa errada que não sei nem por onde começar…

A equipe que fez isso não deve ter sequer pegado uma foto de uma roda de capoeira… falou “ah, lá tem índio e me falaram que capoeira é uma luta misturada com dança”, aí pronto, tacou uns nativos estereotipados tocando uma flautinha, uma viola e um tambor enquanto o Dick descia o sarrafo no pessoal em um palco, se tornando um grande mestre de…

O público paulista vibra com a apresentação!

E a gente achando que a raiz da capoeira estava nos povos africanos trazidos como escravos, ainda bem que este gibi nos trouxe cultura.

O simpático índio Frederico até diz que Dick, ou melhor, “Juanito”, pode se tornar um verdadeiro Capoerista Master! Mas Juanito não pode ficar, pois tem que viajar para Santo de la Rosa, um país próximo. Deve ser bem perto mesmo, porque olha o ônibus autobus que ele pega… ALIÁS, olha a rodoviária de São Paulo:

Certamente fizeram uma pesquisa aprofundada, será que é o Terminal Barra Funda? Ou a Rodoviária Tietê?

Esse cenário parece saído de uma história do Zorro, que provavelmente foi a única referência que usaram para representar a América Latina. Santo de la Rosa é outro festival de esteriótipos, com direito a Dia de Los Muertos, cidades coloniais do Zorro e mais treinamento com indígenas.

Essa maluquice toda é tão fora da casinha que acaba dando uma camada de humor não-planejado para a trama.

Essa história chegou a ser publicada no Brasil, em 2014, pela Editora Abril, encadernada em um formatinho chamado Batman: Os Anos Perdidos. A tradução (não creditada) e a edição (por Mariana Caetano) driblam esses problemas com bastante competência, substituindo “São Paolo, Brazil” por “Terra de Santa Cruz“, um lugar tão fictício quanto Gotham. Continua estereotipado, mas pelo menos já não está errado, né?

Um leitor brasileiro ficou indignado na época e chegou a enviar uma carta para a DC Comics, publicada em Batman Beyond #1, onde a editora se retratou. Esse leitor era ninguem menos que nosso amigo Ivan Costa, um dos nomes por trás da CCXP e organizador da exposição Batman 80 Anos (sobre a qual falamos com ele em um podcast).

E você, ficou indignado, achou engraçado ou só ficou com vergonha mesmo? Deixa seu comentário!

Carlos Vázquez

Mordomo voluntário na Mansão Wayne quando o Alfred se ausenta, faz questão que todas as pessoas que o cercam saibam o nome de pelo menos 3 Robins e decidiu criar este site para transformar todo esse conhecimento “inútil” em algo que possa compartilhar com outras pessoas que tenham interesse.