Bruce Wayne Contra o MundoColunas

Batman, Coringa & O Máskara

ATENÇÃO!
Este texto contém altos spoilers da edição “Batman, Coringa & O Máskara”.
Depois não diz que eu não avisei.


Memória afetiva é uma coisa perigosa.

Às vezes o passado parece muito mais bonito hoje do que devidamente era. É o famoso nos bons tempos. Nenhum tempo é tão bom quanto a gente quer acreditar.
Talvez isso aconteça porque, olhando com distanciamento, conseguimos ignorar parte da realidade e focar apenas no que convém. Nos momentos bons, que te fizeram sentir bem, aqueles que deixam saudade.
E tudo comparado com o hoje acaba parecendo melhor.

De quebra, também temos a famosa “Regra dos 15 Anos”, que sugere ser de bom tom suspeitar da qualidade de qualquer coisa que você consumiu antes da sua primeira década e meia de vida.

Os gostos mudam, a vida muda, seu repertório muda. Você passa a prestar atenção em detalhes que antes pareceriam irrelevantes. Você adquire algo chamado “critério”.
O mundo gira e você gira com ele.

Por isso, é sempre válido ter o pé atrás a respeito de qualquer coisa que você viu ou leu quando criança.
A qualidade que você atribui a uma obra pode se resumir apenas ao carinho que você tem por ela.

Eu tinha 14 anos em janeiro de 2001.
Lembro de estar passando as férias na casa da minha avó em Águas de Lindóia, pra onde eu sempre ia em temporada de férias.
Na pracinha da cidade tinha uma banca de jornal que eu frequentei durante toda a minha infância. Lembro que nessas férias eu tava mais nervoso do que o normal, por começar o ensino médio em uma escola nova, e nunca me dei bem com esse tipo de mudança.
Naquele dia específico, tinha saído com meu tio pra comprar pão no fim de tarde e acabamos passando na banca da praça. Lá, eu usei parte do dinheiro que havia ganhado de Natal para comprar três HQs. Uma foi a maravilhosa Flash Especial: Futuro Relâmpago. Teve uma outra que, de tão qualquer coisa, eu nem faço ideia de qual era. E teve..

Quero deixar claro que, em janeiro de 2001, eu estava praticamente no limite da Regra dos 15 Anos. E por isso que, agora, eu estava com um receio mais que compreensivo em reler a terceira HQ comprada naquele dia, que eu tinha gostado tanto na época.

Mas já posso dizer sem erro.
Batman, Coringa & O Máskara continua divertidíssima!


Lançada como uma minissérie em quatro edições lá nos EUA e reunida aqui em uma edição especial pela Editora Abril menos de um ano depois, a HQ foi um dos primeiros contatos que o público brasileiro teve com o Máskara, além das duas edições de Lobo & Máskara publicadas pela Metal Pesado em 1998, e as seis edições de As Aventuras do Máskara publicadas pela Mythos Editora entre 1997 e 1998. Ah sim, e sem contar também um filme de pequeno orçamento que adaptava o personagem, talvez alguns de vocês até já tenham assistido.


O fato é que as características apresentadas nessa HQ se assemelham muito mais ao filme do que aos quadrinhos, o que ajuda a ninguém ficar perdido.
A trama é extremamente simples, e começa com o Coringa e a Arlequina invadindo um museu, onde a Máskara é convenientemente encontrada por um capanga.


O capanga acaba usando a Máskara, derrota a polícia, o Coringa vê o potencial daquilo, mata o capanga, o Batman chega e blá blá blá… até que acontece o que a gente (ou pelo menos o meu eu de 14 anos) realmente tava esperando.


Com a Máskara, o Coringa começa a dar vida a toda a loucura que tem na cabeça, mete um coro federal no Batman, que – devidamente merendado na bicuda – percebe que tá bem na merda, tenta fugir, é perseguido por uma.. hã.. nave.. pela dupla criminosa, e tem o batmóvel jogado da ponte.


Depois disso, com o Batman ferido e se recuperando, o que a gente vê são duas edições de doideira nas quais o Coringa, agora conhecido pela mídia como Bighead (apesar de no Brasil terem resolvido deixar como Máskara mesmo, na publicação original o personagem que usa a máscara é chamado de Bighead), rouba bancos, toca o terror, mata um monte de gente, invade uma rede de TV e cria sua própria programação pra.. bem.. tocar o terror e matar mais um monte de gente, mas agora em rede nacional.


Sendo cada vez mais deixada de escanteio e percebendo seu pudinzinho ser gradualmente dominado pela Máskara, a Arlequina resolve pedir ajuda. Pra quem mais seria..?


E daí.. daí o Batman resolve voltar!

Eita!


E percebe que o único jeito de fazer o Coringa tirar a Máskara é apelando pra bipolaridade. E funciona! E daí..

POW!


Até que tudo termina, claro, num gostoso cuecão.


Desculpa a pressa, mas o ritmo da história é assim, rápido, sem complicação, pautado no humor ao estilo “desenho animado” unido à violência dos personagens dos quadrinhos. É algo que combina com o Stanley Ipkiss do filme, cujo estilo de maluquice é criado exatamente pela fixação que o personagem tem por desenhos animados.

E esse é o ponto importante de Batman, Coringa & O Máskara. Todo o clima da história e a pegada cartunesca da arte remetem às respectivas séries animadas. O próprio Coringa/Máskara se transforma nas duas versões animadas do Batman.


Isso se dá pela experiência que a dupla Henry Gilroy e Ronnie del Carmen, responsável pelo argumento, tem com esse mundo.
Gilroy, também responsável pelo roteiro da HQ, escreveu tanto Batman: A Série Animada quanto a animação do Máskara. Já Ronnie del Carmen tem experiência há anos no desenvolvimento de storyboards de desenhos como Batman Beyond, escreveu e desenhou uma (ótima) história para a edição vencedora do Prêmio Eisner Batman Adventures Holiday Special (convenientemente com a Harley e a Ivy como protagonistas), além de trabalhar tanto nos roteiros quanto no setor artístico da Pixar, inclusive codirigindo o filme Divertida Mente.
Olhando com frieza, a influência da série animada é tão grande que de repente poderia até render algum processo judici..


…ah, deixa pra lá.

Também a arte reforça essa relação. O desenhista Ramon F. Bachs costuma ter uma arte bem séria, que pode ser vista em títulos como Batman: City of Crime (escrita pelo David Lapham) e as cinco primeiras edições de Red Robin. Aqui, por outro lado, ele investe na arte caricatural, talvez por influência dos storyboards do del Carmen, mas também muito bem auxiliado pela arte-final leve de Howard M. Shum e especialmente pelas cores do Dave McCaig, que são de extrema importância para o clima da história.

É interessante perceber como este Máskara do crossover mistura, de forma até contraditória, as características das HQs com aquilo que é mostrado no filme e na série animada (e quem quiser conferir a versão original do personagem, pode aproveitar que a Editora Pipoca & Nanquim lançou as três primeiras minis no encadernado O Máskara).
Por exemplo o personagem Kellaway, detetive que no filme não passa de um alívio cômico mas que é importantíssimo nas HQs, é mostrado dessa forma mais “séria” aqui no crossover. Por outro lado, o design da Máskara em si remete ao que é mostrado no filme, bem diferente do artefato da HQ.
Essa mistura se escancara na última página, quando Kellaway joga a Máskara no túmulo de Stanley Ipkiss. O personagem morreu ainda no fim da primeira minissérie do Máskara. Mas o visual e as roupas remetem à versão interpretada por Jim Carrey.


Mas péra.
Acho que já to divagando aqui.


Vale apontar que o nome Batman, Coringa & O Máskara (além da capa da edição nacional e deste post) engana. O Batman participa do primeiro número, passa os dois seguintes se recuperando, e volta apenas no final da história.
O nome original, Joker/Mask é muito mais fiel à história, até pela simbiose entre os dois personagens. Vou mais longe e ouso dizer, inclusive, que o nome ideal para esse crossover seria CORINGA, ARLEQUINA E O MÁSKARA, tamanha a importância e carisma da Harley na história.
Mas acho que eram outros tempos.

E felizmente, ser de outros tempos não diminuiu em nada a qualidade e a diversão dessa HQ.
Para o nosso tempo – que definitivamente não está fácil – fica a lição do Coringa no fim da história.

Hmm. Peraí…
Foi só um mau dia mesmo, né?
E a gente riu bastante, matou algumas pessoas, explodiu coisas. Só que no fim deu errado. Mas e daí?


E aí, o que acharam da coluna de hoje?
Num precisa fingir que gostou, não! Deixa essa máscara cair e me conta a real aqui nos comentários!
Entenderam? Máscara! Háhá! Há!
Ai ai, viu..

Thiago Brancatelli

Lindo, alto e charmoso. Não possui bichos de estimação, mas divide o aluguel com um cachorro vira-lata chamado Tyler. Já fez tudo o que queria antes dos 30, por isso passa seus dias deitado no sofá lendo quadrinhos, vendo Netflix e comendo Tortuguitas. Está em um relacionamento sério com o site XVideos, mas é apenas pelo sexo.